Financiamento de bancos à monocultura de eucalipto no Vale do Jequitinhonha causa grandes impactos ambientais

13 julho 2022

Estudo mostra como a monocultura de eucalipto no Alto Jequitinhonha é responsável pela expropriação de terras e águas de agricultores da região.

 

 

O Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica (CAV) estabeleceu uma parceria com pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (INFMG), Universidade Federal Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Instituto Federal do Leste de Minas Gerais (IFLMG) e Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais (IFSMG) para realizar, com o apoio do Idec, o estudo "Salvaguardas ambientais: analisando impactos da monocultura de eucalipto". Esse estudo analisou os impactos socioambientais causados pela produção de eucalipto em larga escala na região das chapadas do Alto Jequitinhonha, em Minas Gerais. 

Nos anos 1970, um conjunto de empresas recebeu incentivos fiscais públicos, propostos pelo governo militar, para implementar extensas monoculturas de eucalipto na região. Hoje, os planaltos são explorados pela empresa Aperam Bioenergia, que produz o carvão vegetal utilizado para a fabricação de metal inoxidável do grupo Aperam. 

A diminuição da recarga de água, o rebaixamento dos lençóis freáticos, o secamento de veredas e nascentes e a diminuição das vazões dos rios são apontados como as principais consequências diretas do plantio do eucalipto. Isto porque os eucaliptais substituíram o cerrado, vegetação nativa daquele território, passando a ocupar 61,5% dos planaltos do Alto Jequitinhonha. 

O estudo demonstra que enquanto o bioma nativo é capaz de absorver 50% de toda a água da chuva para recarregar os lençóis freáticos, as áreas submetidas aos monocultivos de eucaliptos são capazes de absorver somente 29% do que chove para abastecer a recarga da água subterrânea. Isto porque a espécie, sobretudo quando plantada em monocultivo, demanda muita água.  

Além da perda da biodiversidade, o secamento das fontes de água afeta profundamente as comunidades de agricultores familiares que tradicionalmente ocupam a região. O estudo de caso revela que as famílias foram expropriadas de seus territórios pelo processo de ocupação da empresa, sendo expostas a uma situação de extrema insegurança hídrica, lidando cotidianamente com a restrição ao direito fundamental ao acesso à água para o consumo doméstico e produtivo. 

Na região analisada, 52% das famílias têm consumo médio de 43 litros de água por habitante/dia, enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabelece como quantidade mínima de consumo 110 litros de água por habitante/dia.  Os custos atuais de abastecimento de água recaem sobre as próprias famílias, o poder público e a sociedade como um todo, que custeiam caminhões pipas para garantir o acesso mínimo à água, enquanto o lucro pela exploração da atividade econômica é apropriado pela empresa.   

O estudo destaca o impacto devastador da monocultura do eucalipto, apontando para a necessidade de se redimensionar a extensão do plantio de modo a recuperar a vegetação nativa local, contribuindo para a recuperação da recarga hídrica da região, da biodiversidade e para a mitigação dos consequentes impactos sociais sofridos pelas comunidades do entorno, que são centrais na busca por soluções aos problemas socioambientais evidenciados. 

A pesquisa revela a responsabilidade das instituições financeiras que fomentam o desenvolvimento da monocultura do eucalipto, uma vez que cabe a eles a exigência da adoção de compromissos e salvaguardas socioambientais pelas empresas que desempenham esse tipo de atividade, de modo a prevenir e mitigar os impactos identificados no estudo. 

Guia dos Bancos Responsáveis (GBR) e os resultados do estudo

As violações socioambientais causadas pela Aperam no Alto Jequitinhonha, remetem a três temas avaliados no Guia dos Bancos Responsáveis (GBR): Direitos Humanos, Florestas e Meio Ambiente. Na última avaliação, em uma escala de zero a dez, os bancos receberam nota média de 6 pontos em Meio Ambiente, enquanto que em Direitos Humanos o desempenho médio foi de 3,6 e, no tema Florestas, 2,5.

Segundo o estudo, entre 2016 e 2017, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) foi o segundo principal financiador das atividades da Aperam Bioenergia, tendo aportado R$ 34.054.000,00 à empresa. Em seu site, a Aperam informa que "esta empresa tem o apoio do BNDES". 

Ao analisarmos as notas recebidas pelo banco nas edições do GBR de 2018 e 2020, vemos o baixo desempenho nos temas relacionados ao estudo, em especial, o tema Florestas e Meio Ambiente. 

 

 

O tema Florestas avalia, por exemplo, se o banco se compromete a exigir das empresas que apoia a prevenção de conflitos sobre o direito à terra e, ainda, se restringe a aquisição de recursos naturais ao consentimento livre, prévio e informado (CLPI) dos povos com direito costumeiro de posse da terra. 

Já dentre os elementos analisados no tema Meio Ambiente, avalia-se se as empresas adotam medidas abrangentes de mitigação para atender aos requisitos de água da comunidade e do ecossistema nos locais em que tenham identificado a probabilidade de impactos significativos nos recursos hídricos. 

O estudo também destaca que, entre os anos de 2016 e 2018, o Banco Votorantim (BV) financiou as atividades da Aperam, tendo aportado R$ 2.582.000,00 à empresa. A análise de seu desempenho nas últimas duas edições do GBR também indicam baixos compromissos nos temas relacionados ao trabalho do CAV. Em seu caso, há destaque especial para os temas de Direitos Humanos e Florestas, com notas médias inferiores a três, em uma escala de zero a dez. 

O tema direitos humanos avalia, por exemplo, se é exigido das empresas financiadas a existência de processos para remediar qualquer impacto adverso nos direitos humanos que a atividade empreendedora possa ter causado ou para o qual possa ter contribuído.

 

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